A cegueira do brasileiro em relação aos impostos que paga
Estado acusa indústria e comércio por preços altos e políticos convencem população de que governo lhe dá algo de graça
Em 2018, uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) colocou o Brasil em primeiro lugar no ranking de países que mais cobram impostos sobre medicamentos em todo o mundo. Em relação aos alimentos, a alíquota média é de 22,5%, enquanto mais de 40% da conta de energia elétrica é de impostos, como PIS, Cofins e ICMS.
Em 1º de janeiro deste ano, enquanto a população parcelava os comes e bebes do Réveillon, o governo federal retomava integralmente a cobrança de impostos sobre o óleo diesel e o gás de cozinha.
Considerando a carga tributária geral, a Hungria é o país que mais cobra impostos atualmente, chegando a 26%. Porém, como o Brasil não gosta de ficar por baixo, com a reforma tributária anunciada em 2023 pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o País assumirá a liderança mundial com surreais 27,5%.
Com R$ 186,52 bilhões em arrecadação, o Brasil bateu o recorde para fevereiro, com uma alta de 12,27% em relação ao mesmo período do ano passado. Por outro lado, 70% da população recebe menos de dois salários mínimos, tornando-se dependente de serviços públicos precários, insuficientes e, muitas vezes, inexistentes.
E a pergunta é: por que o brasileiro se revolta quando um aplicativo de mensagens para de funcionar e discute na internet sobre o conflito entre Israel e Hamas, mas não liga a mínima para o fato de ter de trabalhar cinco meses por ano apenas para pagar impostos?
Me arrisco a trazer à tona duas possíveis explicações – ainda que seja difícil de engolir que esse tipo de estratégia funcione tão bem. A primeira delas é termos um Estado que desde sempre marginaliza quem produz e que, além de impor uma carga tributária pesadíssima, também lança sobre seus ombros a falácia de que os preços altos vêm da ganância da indústria e do comércio. A narrativa é tão frágil que um único dado é capaz de fazê-la cair por terra: 96,3% do total de empresas no Brasil é de pequeno e médio portes, incluindo Microempreendedores Individuais (MEIs) e microempresas.
E a segunda – que chega a ser ainda mais ridícula – é a proeza de maus políticos brasileiros que conseguiram convencer grande parte da população de que o Estado cobra dos ricos para dar de graça aos mais pobres.
Por conta da enorme taxação sobre o consumo, pobres no Brasil pagam mais impostos do que ricos. Neste país, os pobres não têm garantia de saúde, educação, transporte ou qualquer outra coisa que o Estado deveria prover com a fortuna que arrecada. Mas a realidade é que o pobre só tem o que o capitalismo lhe permite: geladeira, televisão, celular e, talvez, um transporte próprio comprado a duras penas.
Enquanto durar essa cegueira tributária, a farra com o dinheiro do contribuinte vai seguir firme e forte.
*Por Patricia Lages, jornalista