Quanto custa o vício em álcool e quem paga essa conta?
Mercado global lucra US$ 32,9 bilhões por ano, enquanto o Brasil perde quase R$ 19 bilhões com hospitalizações e procedimentos relacionados ao consumo de bebidas alcoólicas
Não existem limites seguros para a ingestão do álcool, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Ainda assim, seu consumo é amplamente incentivado em propagandas que chegam a pessoas de todas as idades e gêneros e traz consequências como prática de sexo desprotegido, brigas, traumas e acidentes, principalmente no trânsito. O álcool também é frequentemente associado a incidentes de violência doméstica e pode levar a separações e divórcios, o que afeta a estabilidade e o bem-estar familiar, além de trazer inúmeros perigos à saúde, pois está associado a mais de 200 doenças, dentre elas o alcoolismo.
Enquanto isso, as indústrias de bebidas alcoólicas lucram: uma reportagem da revista Forbes aponta que o mercado global de bebidas alcoólicas movimentou US$ 32,9 bilhões em 2023 e deve atingir US$ 85,5 bilhões em 2030. Por outro lado, um levantamento divulgado no início deste mês pela FioCruz Brasília mostra que, em virtude do consumo de bebidas alcoólicas, o Brasil perde anualmente R$ 18,8 bilhões. Só em custos federais diretos com hospitalizações e procedimentos ambulatoriais no Sistema Único de Saúde (SUS) o valor chega
a R$ 1,1 bilhão.
Já os gastos indiretos com perdas de produtividade pela mortalidade prematura, licenças médicas previdenciárias, aposentadorias precoces e a perda de dias de trabalho por internação hospitalar somam R$ 17,7 bilhões. O custo previdenciário atingiu R$ 47,2 milhões em 2019, quando foram gastos R$ 37 milhões com o público masculino e R$ 10,2 milhões com as mulheres.
Para Marília dos Reis Antunes, biomédica e pesquisadora sênior do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa) – entidade referência sobre o consumo de álcool no Brasil –, o consumo abusivo de álcool está relacionado a diversas doenças do fígado, como hepatite alcoólica, esteatose hepática, cirrose e também o câncer de fígado. “O seu uso excessivo e prolongado pode causar deterioração cognitiva, afetando funções cerebrais como memória e concentração, e também demência alcoólica. Os homens apresentam maiores índices históricos de consumo de álcool. No entanto a diferença vem caindo nos últimos anos, com o aumento do consumo entre as mulheres”, cita.
Contudo, para Alessandro Alencastro, professor e coordenador do curso de enfermagem da Faculdade de Educação Paulistana (Centro Universitário Faep), independentemente do sexo, os jovens são o público-alvo mais atingido. “Isso ocorre principalmente no período da adolescência, pois é nessa época que o álcool e diversas outras substâncias ilícitas são apresentadas aos jovens, junto com os desafios para se manterem e se tornarem populares dentro de uma determinada comunidade ou até mesmo serem aceitos. Muitas vezes, a apresentação dessas substâncias, incluindo o álcool, traz a falsa ideia ao adolescente de que se ele beber ‘enfrentará melhor os problemas que surgem’, o que não é verdade”, pondera.
Por isso, o professor considera o papel da família fundamental para combater o álcool. “A família é a base, o refúgio quando tudo lá fora dá errado. É na família que a criança encontra sua primeira formação e onde o adolescente tem que buscar refúgio. Por isso devemos ter cuidado com o que essa criança presencia. Os pais precisam ser a rede de apoio, evitando ser um péssimo exemplo ao pedir que os filhos experimentem álcool. Por outro lado, ao perceber algum desvio do comportamento do adolescente, a família deve buscar ajuda profissional o quanto antes para que isso não se torne um grande problema futuro que poderá impactar toda a família”, alerta.
Marília afirma que, apesar dos efeitos prejudiciais do alcoolismo, a recuperação é possível quando o processo é realizado por meio de tratamento adequado (veja os quadros). “É um processo individualizado, que geralmente envolve uma combinação de abordagens. Ele pode ter início com uma avaliação médica para identificar problemas de saúde relacionados ao álcool e determinar o melhor plano de tratamento. Em alguns casos, é necessária uma desintoxicação sob supervisão médica para lidar com os sintomas da abstinência. A terapia, seja individual, seja em grupo de ajuda mútua, como os Alcoólicos Anônimos (AA), é um componente-chave do tratamento, ajudando o indivíduo a entender os padrões de comportamento relacionados ao consumo de álcool e a desenvolver estratégias de enfrentamento”, conclui.
Saiba mais:
Leia as demais matérias dessa e de outras edições da Folha Universal, clicando aqui. Folha Universal, informações para a vida!