A força do voluntariado – Cauda longa: os civis estão ajudando os civis. É fato. Não é fake

Em meio à tragédia no Rio Grande do Sul, brasileiros dão uma lição de solidariedade e amor ao próximo

Imagem de capa - A força do voluntariado – Cauda longa: os civis estão ajudando os civis. É fato. Não é fake

Nos últimos dias, os brasileiros têm mostrado ao mundo o verdadeiro significado da palavra solidariedade. Um número incontável de pessoas, anônimas e famosas, deixaram suas atividades pessoais e se voluntariaram para amparar a população de diversas cidades do Rio Grande do Sul. Os fatores climáticos, combinados à negligência dos governantes, fizeram com que chuvas torrenciais afetassem todo o Estado. Algumas cidades, como Santa Maria, Caxias do Sul e Porto Alegre, registraram em dez dias o triplo das chuvas esperadas para o mês inteiro.

Esse volume expressivo de chuva afetou diretamente os rios que cortam o Estado. No momento mais crítico, o Lago Guaíba, na capital gaúcha, alcançou o nível inédito de 5,33 metros, o que causou inundações que destruíram casas, comércios e tudo que tinha pela frente, inclusive o Centro Histórico. Ruas se transformaram em rios e em poucos minutos os moradores viram seus lares serem tomados pela força da água, que chegou ao teto e deixou apenas os telhados de fora. As cenas impressionantes se repetiram em muitas localidades.

Segundo dados da Defesa Civil, 463 municípios do Rio Grande do Sul foram atingidos pela catástrofe. O número corresponde a aproximadamente 90% das cidades do Estado. Até o fechamento desta edição, cerca de 2,3 milhões de pessoas foram afetadas, sendo que mais de 540 mil tiveram que abandonar suas casas e, muitas delas, apenas com a roupa do corpo.

Nesse cenário de caos, em que a vida de milhares de pessoas foi colocada em risco, as primeiras ações de socorro foram lideradas pelo próprio povo. Inúmeras imagens que circulam pela internet mostram gente comum correndo perigo para salvar desconhecidos. Eram cidadãos que sentiram a dor do próximo e enfrentaram a água suja a pé, em canoas, jet skis e até escavadeiras com um único objetivo: proteger homens, mulheres, crianças e animais.

“Os meus amigos me perguntam assim: ‘tu tirou quantas pessoas de dentro da água? Eu não contei. Eu só tirei. O problema não foi as que eu tirei, a quantidade, eu não quero ser herói. O problema foi as que eu não consegui tirar”, desabafou um anônimo em um vídeo que circula pelas redes sociais. O relato representa a dor de muitos voluntários que deram o seu melhor, mas se sentiram impotentes diante de tamanha tragédia.

A Defesa Civil estima que 83 mil pessoas tenham sido resgatadas ao longo dos últimos dias. Algumas delas ficaram ilhadas em suas casas e passaram dias aguardando o resgaste, sem água ou comida. Inclusive idosos foram vistos em cima de telhados tentando se proteger. Apesar dos esforços, infelizmente, a tragédia fez muitas vítimas. Aproximadamente 800 cidadãos ficaram feridos e outros 155 perderam a vida.

“O que eu mais ouvi é que se não fossem os voluntários, se não fosse a própria população, mais gente teria morrido. Há uma desconfiança generalizada em relação ao Poder Público. Até que ponto as pessoas poderiam ser mais bem avisadas, mais bem alertadas? Até que ponto, depois que as enchentes começaram, o Poder Público poderia tê-las atendido melhor?”, questionou o jornalista Roberto Cabrini, da Record. que foi até o Rio Grande do Sul acompanhar os desdobramentos da catástrofe.

Sem limites para fazer o bem

Não demorou muito para que a situação vivida pelo Rio Grande do Sul tocasse moradores de outras partes do País. No decorrer dos dias, centenas de pessoas deixaram seus Estados para ajudar os mais vulneráveis. Um grupo de atletas, por exemplo, levou jet skis para auxiliar no resgate de vítimas. Outros profissionais, como médicos, bombeiros e enfermeiros, também foram recebidos em terras gaúchas.

Diante de tamanha destruição, porém, era preciso mais: mais voluntários, mais comida, mais água e mais estrutura. Foi então que de Norte ao Sul do País uma grande mobilização foi tomando forma. Sem olhar para qualquer dificuldade, as pessoas se uniram para dividir o que tinham com aqueles que perderam tudo. Os meios de comunicação, como um todo, foram ferramentas poderosas para divulgar informações e concentrar esforços.

“Eu tô aqui porque não fazia sentido. Eu estava enlouquecendo em casa já, assistindo às notícias, vendo o sofrimento das pessoas e eu em casa com luz, com água e com todo o conforto do mundo”, afirmou o voluntário Mateus Dornelas ao Jornal da Record. Ele tem levado comida para os moradores que não quiseram deixar suas casas. Como ele, há inúmeros relatos de pessoas que se colocaram à disposição para atuar no resgate de pessoas, na organização dos abrigos e na distribuição de água e alimentos. Outro voluntário falou da condição da população afetada: “está bem complicado. Muita gente desesperada e a comoção é gigantesca. Quem está ajudando aqui é a própria população. Você vê que é o civil que está correndo atrás para auxiliar, para ajudar”.

Mesmo quem não pôde auxiliar presencialmente mostrou que não há limites para aquele que quer fazer o bem. “Na verdade, eu queria estar no Rio Grande do Sul para conseguir salvar as pessoas, mas, como não é possível, qualquer ajuda é bem-vinda. Então, eu me prontifiquei a estar aqui para conseguir de alguma forma ajudá-los”, afirmou a técnica de enfermagem Geovana Freitas à Record. Em São Paulo, ela tem prestado apoio à população gaúcha fazendo a triagem de doações que serão levadas ao Estado.

Inclusive, pontos de arrecadação de donativos surgiram por todo o Brasil para reunir alimentos, água, cobertores e roupas, entre outros itens, para atender aqueles que de uma hora para a outra ficaram sem nada. “É só você abrir o seu armário e ver o que tem para disponibilizar para ajudar alguém. Alguma coisa vai servir para outra pessoa”, comentou o administrador Rodrigo Paiva, que levou donativos até uma agência dos Correios.

E, à medida que o Rio Grande do Sul se transformou no principal tema discutido no País, espalhou-se a chama da solidariedade. Assim, o prazer de ajudar passou a ser o combustível para levar dignidade e maior conforto aos sofridos nesse momento desesperador. Pensando nas pessoas que estão em abrigos, sem conseguir se comunicar com os familiares, especialistas em informática se uniram e criaram uma plataforma para conectar pessoas. Em apenas duas semanas, 50 mil pessoas foram cadastradas e cerca de 300 reencontros foram possíveis graças ao site que é administrado pelos próprios voluntários.

“Infelizmente, a gente não sabe nadar, a gente não sabe pilotar um barco, a gente não tem jet ski, então a gente usou nosso ramo, digamos assim, que é a TI (tecnologia da informação), para desenvolver uma plataforma, já que para nós é muito simples um cadastro unir pessoas e pode fazer toda a diferença para as famílias”, afirmou o voluntário Pedro Viana.

Todas as ações citadas até aqui mostram a força do brasileiro e o seu desprendimento quando o assunto é estender a mão ao próximo. “Além de ver toda a destruição no Rio Grande do Sul, é preciso conhecer o outro lado, o lado da solidariedade, o lado belíssimo de seres humanos, independentemente da religião, que está fazendo a diferença e não esperando que alguém faça alguma coisa. Eles estão fazendo a parte deles e isso renova a nossa esperança, a nossa fé no ser humano. Isso mostra que ainda há pessoas que estendem a mão para ajudar o próximo numa situação de maior necessidade”, afirmou o Bispo Renato Cardoso, responsável pelo trabalho da Universal no Brasil, durante o programa Entrelinhas.

Unisocial em ação

A Igreja Universal também se mobilizou intensamente nos últimos dias. O trabalho social que já acontece no Rio Grande do Sul ganhou reforços. Desde o início, quando as primeiras famílias foram afetadas, os voluntários do Unisocial – que une todos os programas sociais mantidos pela Universal – entraram em ação para levar mantimentos, água, kits de higiene e outros itens essenciais às famílias que foram afetadas. Assim começou a campanha SOS Chuvas Rio Grande do Sul.

Com o passar dos dias, a situação se agravou e alguns templos foram afetados pela chuva, inclusive a Catedral de Porto Alegre. Em um vídeo publicado nas redes sociais, o responsável pela Universal no Rio Grande do Sul, Bispo Guaracy Santos, mostrou o salão da igreja tomado de água que cobria as poltronas. O momento de dor e perda não limitou o trabalho dos voluntários, pelo contrário, o reforçou. Bispos, pastores, obreiros e membros não se intimidaram e mais uma vez se colocaram à disposição para servir.

Diante do número de vítimas e pessoas afetadas, o Estado recebeu reforço de todo o Brasil. Os templos da Universal em São Paulo, Santa Catarina e no Paraná se transformaram em pontos de arrecadação de donativos. Além disso, pessoas de outros Estados puderam fazer doações por meio de PIX e elas foram revertidas em itens essenciais.

Desde então, carretas e mais carretas saem de pontos estratégicos carregadas de mantimentos, colchões e tudo que pode amenizar a dor do povo gaúcho. Cada veículo que sai para entrega tem uma despedida marcada por muitos aplausos que representam o prazer de poder fazer o bem. Não tem como assistir a uma cena como essa e não se emocionar. “É gratificante e ao mesmo tempo ficamos com o coração apertado por tudo que está acontecendo lá”, afirmou a caminhoneira Lili, que levou sozinha um caminhão de donativos do Unisocial. “Eu me emociono porque a gente tem família e se coloca no lugar de quem perdeu [alguém]”, completou.

Prazer em servir ao próximo

Com tamanha quantidade de água e a lenta vazão dos rios, os voluntários do Unisocial se desdobraram para conseguir auxiliar os moradores ilhados e, muitas vezes, se viram limitados para atender tanta gente utilizando apenas um barco a remo, mas a doação de dois barcos a motor agilizou o trabalho e permitiu que mais pessoas fossem ajudadas.

Antes do Estado receber esses barcos, o Bispo Guaracy falou disso: “só não havíamos feito mais porque nos faltavam algumas coisas, como um barco. E agora nesse caminhão estão vindo dois barcos doados por um empresário membro da Universal em São Paulo. E com esses barcos nós vamos entrar em cidades isoladas, onde as pessoas e o nosso povo estão precisando de ajuda e ninguém consegue entrar a não ser com barco”.

Os números contabilizados até o dia 19 de maio mostram que, por meio da campanha SOS Chuvas Rio Grande do Sul, mais de 25 mil voluntários conseguiram ajudar os habitantes de 334 municípios, como Bento Gonçalves, Guaíba, Lajeado e Encantado, com doações de 264,9 toneladas de alimentos, 819 mil garrafas de água, 17,1 mil kits de higiene, 57,5 mil cobertores, 92,8 mil roupas, entre outros donativos.

“Nós estamos muito felizes em poder ajudar as pessoas que estão sofrendo e entregar a elas os produtos para usarem no dia a dia. Percebemos em cada entrega o quanto a população está sensível. As pessoas choram e nos agradecem. Nós levamos roupas, comida, água e produtos de higiene e a nossa felicidade nesse momento é essa: ajudar a quem precisa”, relatou Cleonice Barreto Teixeira Borges, de 34 anos, voluntária
do Unisocial.

Segundo ela, além da atenção especial aos abrigos, o grupo também tem visitado os que buscaram refúgio na residência de familiares. “Há casas que estão sendo divididas por 20 pessoas. Visitamos também as igrejas e levamos donativos, para que ela seja um ponto não só de arrecadação, mas também de doação de produtos”, relatou. Vale destacar que a entrega dos alimentos independe de crença religiosa. As portas das igrejas estão abertas a todos e os itens são distribuídos a todos.

Por conta da condição precária de muitas pessoas, a atenção e o carinho dos voluntários também se tornaram essenciais, conforme falou Cleonice: “temos o espírito da fé para levar ao próximo, conseguimos transmitir paz e esperança, além de passar a confiança de que tudo passará”.

Suelen Ajardo, de 34 anos, é uma das voluntárias do Unisocial e já atuou em diversas ações sociais promovidas pelo projeto. Desta vez, no entanto, ela foi uma das beneficiadas. “Eu e meu marido moramos no centro de Porto Alegre. A água começou a subir muito rápido. Não consegui pegar quase nada, pois tive que sair correndo quando houve o alerta para evacuar o local. Desde então, recebi alimentos, água, roupas e cobertores do Unisocial”, comenta.

Apesar da tristeza de ter perdido o que conquistou ao longo dos anos, nada impediu o casal de ajudar outras pessoas: “meu marido tem ajudado diariamente nos salvamentos e no apoio a outras pessoas. O que me deixa confiante é a fé que eu tenho em Jesus Cristo. Eu sou muito grata pelo trabalho da Igreja Universal, pois, apesar de também ter sido afetada, não parou de ajudar. Maravilhoso exemplo”.

A história de Talita Silva de Oliveira, de 27 anos, é semelhante à de Suelen. Ela teve que sair às pressas de casa e buscou abrigo na casa da irmã que vive em outro bairro. “Eu estava dormindo no chão e pedi um colchão para o Unisocial. Eles o trouxeram até aqui e também água, uma mantinha e uma cesta básica. Para mim, é muito importante saber que temos esse apoio”, afirmou. O amparo chegou em boa hora e reforçou a necessidade de estar pronto para dar o melhor ao próximo. “Sempre fazer pelo próximo algo que tu quisesses que fizessem para ti”, disse Talita.

Outra pessoa beneficiada pelo trabalho social foi Rosane Almeida, de 62 anos. “Quero agradecer à Universal, pois estava na beira da estrada com meus netos e o cobertor e as refeições chegaram em boa hora. Só tenho gratidão por tudo que estão fazendo pela minha família aqui na Ilha das Flores”, observou.

A lentidão do estado

Enquanto milhares de voluntários colocaram (e têm colocado) toda a sua força para amparar os gaúchos, a resposta do Poder Público diante desta crise foi aquém do esperado. Em meio a cidades inundadas, o governo federal fez uma série de promessas de apoio, mas demorou uma semana para anunciar medidas concretas para ajudar a população.

Além disso, a criação de uma Pasta para cuidar da reconstrução do Estado levou duas semanas e terá como chefe Paulo Pimenta, ministro das Comunicações, o que inevitavelmente parece incompatível. Governistas e opositores criticaram a indicação. Muitos viram motivações políticas na escolha, já que Pimenta seria um possível candidato ao governo do Estado em 2026.

Outra sugestão bastante criticada veio do Ministério da Igualdade Racial, comandado por Anielle Franco. A Pasta solicitou o atendimento preferencial de famílias ciganas, quilombolas e de terreiros. A ideia, incompreensível, ignorou a necessidade de todo o restante da população que também perdeu tudo. Os acontecimentos dos últimos dias são terríveis e impactam a todos e não apenas quilombolas e ciganos.

Também não foi muito simpático da parte do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, relacionar as doações que chegam à população à queda do comércio local e dar a entender que os donativos estariam impactando as vendas no Estado. Posteriormente, ele se desculpou nas redes sociais e tentou corrigir sua declaração.

Fake News ou falta de comunicação?

Em eventos impactantes como o do Rio Grande do Sul sempre circulam notícias falsas pela internet, disseminadas por pessoas que se dedicam a atrapalhar o trabalho de quem quer ajudar. Há informações, porém, que são verdadeiras, mas foram consideradas fake news para disfarçar a falta de uma comunicação assertiva entre os setores públicos.

Em Araranguá, Santa Catarina, um comboio de caminhões da Defesa Civil do Estado que levava donativos foi multado em uma fiscalização porque estava acima do peso permitido. O assunto foi divulgado por uma emissora de TV. Inicialmente, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) negou que estivesse retendo veículos de carga que se dirigiam ao Rio Grande do Sul e afirmou ainda que não estavam sendo solicitadas notas fiscais nem aplicadas multas. O tema passou a ser tratado como fake news e a repórter foi hostilizada nas redes sociais. Pouco tempo depois, o diretor-geral da ANTT, Rafael Vitale, confirmou que foram aplicadas seis multas: “houve casos isolados de autuação por excesso de peso, na balança de Araranguá, que não se tornarão multas e serão anulados”, afirmou.

Esse é apenas um exemplo dentre outros que aconteceram, mas já deixa clara a falta de preparo das autoridades de diversos níveis de agir rapidamente em momentos de crise. Não tem como tratar toda a crítica como fake news. É preciso fazer uma checagem, pois, se for algo verdadeiro, ações podem ser tomadas tendo como foco a população. Saber ouvir é importante para que a gestão seja eficiente.

O povo pelo povo

Existe uma certeza: não dá para ficar de braços cruzados à espera de uma ação do Poder Público. É preciso agir. “O Rio Grande do Sul precisa ser reconstruído em suas principais partes e, quanto mais rápido isso acontecer, melhor. Por isso, hoje, o Brasil é o Rio Grande do Sul. Um dos maiores celeiros de alimentos da nação precisa de todo o esforço de todos os brasileiros para se colocar de pé”, disse o Bispo Renato Cardoso, no programa Inteligência e Fé.

Por isso, o SOS Chuvas Rio Grande do Sul continua e você, caro leitor, está convidado para fazer parte dessa corrente de solidariedade e abraçar o lema “A dor do próximo é a nossa também”. Você pode doar itens essenciais nos templos da Universal de São Paulo, Paraná e Santa Catarina ou pelo PIX social@universal.org.

“A Bíblia diz que quando ajudamos o próximo, se nós necessitarmos de ajuda um dia, essa ajuda voltará para a gente. É dando que se recebe, ensinou o Senhor Jesus. Jesus disse que quando você vê uma pessoa com fome, precisando de roupa, precisando de alguma coisa, você deve fazer para ela, como se estivesse fazendo para Ele. Na verdade, você está fazendo para Ele por intermédio daquela pessoa. Então, esta é a obrigação de todos aqueles que dizem que creem em Deus”, concluiu o Bispo.

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Colaborador

Cinthia Cardoso / Fotos: Ricardo Giusti/Correio do Povo, JORGE LANSARIN/ENQUADRAR/ESTADÃO CONTEÚDO, BRUNO KIRILOS/ENQUADRAR/ESTADÃO CONTEÚDO, Cedidas, Demetrio Koch