“Boas intenções” mais atrapalham que ajudam a mulher

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Uma das mais célebres frases do economista norte-americano Milton Friedman diz: “Um dos maiores erros que existem é julgar os programas e as políticas públicas pelas intenções e não pelos resultados”. O conceito também se aplica às ideias bem-intencionadas que causam um efeito oposto ao esperado, como as novas “regras” que estão surgindo com o objetivo de proteger a carreira profissional das mulheres, mas que, na prática, vão atrapalhá-las ainda mais.

Um dos exemplos que comprovam que boas intenções não garantem bons resultados é a Emenda Constitucional 72, popularmente conhecida como PEC das Domésticas. Promulgada em abril de 2013, a ideia era garantir igualdade de direitos trabalhistas ao emprego doméstico, ocupado em 92% por mulheres, sendo 65% negras. Mas, na prática, não foi isso que aconteceu.

Dez anos após a implementação da PEC, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que o número de empregadas domésticas registradas diminuiu e, atualmente, três em cada quatro não têm carteira assinada. Em contrapartida, o número de diaristas aumentou, assim como a carga de trabalho.

Em entrevista à Agência Brasil, Luiza Batista Pereira, coordenadora-geral da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), explicou a situação da classe depois da PEC: “Na hora de readequar o orçamento, quem primeiro é excluída é a trabalhadora doméstica. Quando ela fica sem renda, aceita fazer as tarefas mais pesadas da casa em dois dias na semana, recebendo por diária, porque ela está desempregada, não tem outra fonte [de renda].”

Novas regras pretendem poupar as mulheres de “perguntas e comentários inadequados” nos processos de recrutamento e seleção, mas devem, mais uma vez, surtir o efeito contrário. Consultorias especializadas em recolocação de executivas querem eliminar certos questionamentos até então comuns nos processos seletivos, entre eles: a idade da candidata, se ela tem filhos e quem os leva ao médico quando ficam doentes.

Segundo esses especialistas, esses tipos de perguntas são “de cunho pessoal muito grande, invasivas, inapropriadas e irrelevantes” e também que empresas que fazem esses questionamentos querem se “eximir desde o início da responsabilidade de criar um ambiente inclusivo” para as mulheres. Na minha análise, essa é mais uma ideia (que talvez seja) bem-intencionada, mas que mais atrapalha do que ajuda.

Em vez de criarem mais regras de patrulhamento da fala, esses especialistas deveriam conscientizar as empresas de que uma mãe que deixa tudo para levar o filho doente ao médico possui alto senso de responsabilidade e sabe priorizar o que é mais importante. Logo, esse é o tipo de pessoa que saberá cumprir, com maestria, todas as demais funções dentro
da corporação.

Em meus 34 anos de carreira, trabalhei com muitos tipos de mulheres, em quatro países de três continentes, com idiomas e culturas diferentes, e posso afirmar que aquelas que priorizavam a família eram as mais competentes, as mais responsáveis e, portanto, as mais confiáveis para cargos de liderança. Eram elas que davam exemplo aos subordinados de que, apesar de terem faltado ao trabalho por questões familiares, seu desempenho profissional se mantinha impecável.

Esse é o grande diferencial das mulheres: nós podemos conciliar responsabilidades e desempenhar vários papéis sem deixar a desejar. É nisso que está a nossa força. Não nos reduzam a vítimas que se encolhem em um canto só porque alguém pergunta nossa idade ou se pretendemos ter filhos e cumprirmos nossas responsabilidades para com eles. Não diminuam a força da mulher enquanto fingem se importar com ela.

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Colaborador

Por Patricia Lages, Jornalista / Foto: Fizkes/GettyImages