Infidelidade financeira: O problema que está causando milhares de divórcios
Muito mais do que gastos exagerados e ocultos, esse tipo de traição traz à tona a falta de transparência no casamento
A dificuldade de falar sobre dinheiro e lidar com ele de forma conjunta tem se transformado em um problema para os casais. Segundo dados do SPC Serasa, as finanças são motivo de desentendimento em 46% dos relacionamentos. Os gastos acima do orçamento são a principal causa das brigas e, em seguida, aparecem gastar tudo o que ganha e não fazer uma reserva financeira, discordar em relação aos gastos da casa e atrasar o pagamento das contas.
Tantas divergências em relação a como gerir o orçamento doméstico têm levado ao aumento de casos de infidelidade financeira. O termo é novo e ainda não existe uma definição legal para ele, mas indica a omissão de informações financeiras por parte de um dos cônjuges ou quando um deles não cumpre o que foi previamente combinado. De forma geral, ela pode acontecer em quatro situações: omissão de bens, de dívidas, de renda e de despesas.
Ainda segundo o levantamento do SPC Serasa, a principal justificativa para não dividir as informações financeiras com o cônjuge é evitar brigas e conflitos (45%), guardar parte da renda para gastar como quiser (25%) e não falar da vida financeira para que não tenha o dinheiro controlado por outra pessoa (15%).
A pesquisa deixa claro que, apesar do tema ser o dinheiro, a infidelidade financeira não se restringe ao uso dos recursos e interfere em outros aspectos da vida de um casal, como a confiança, a união e a transparência. Sem esses pilares, o relacionamento se desgasta, ocorrem brigas e elas podem culminar na separação ou no divórcio.
O individualismo no casamento
Enquanto os solteiros podem fazer o que quiserem com o dinheiro, uma vez que não têm de dar nenhum tipo de satisfação, os casados precisam entender que a renda é dos dois e que, quando um dos cônjuges fere esse acordo e age pensando apenas em si mesmo, há uma quebra de confiança. “Traição não é só na cama e pode ser no bolso também. Muitas pessoas não veem desta forma, pois a falha é o conceito que o casal tem sobre o dinheiro. Os dois veem o dinheiro de forma individual”, explicou o apresentador Renato Cardoso no programa The Love School, exibido pela Record TV.
A raiz dessas atitudes individualistas pode ser a insegurança e os traumas do passado, opinou, no mesmo programa, Cristiane Cardoso: “há um conceito muito moderno que vemos de alguns anos para cá de que, por mais que se entre em um casamento e se forme uma família, cada pessoa precisa ter sua independência. ‘Eu faço o que quero, vou aonde quero, gasto o que quero e tenho o que quero’. Com esse conceito fica muito difícil um casamento funcionar”.
Essa suposta independência termina quando as dívidas adquiridas em decorrência de decisões impulsivas afetam o orçamento dos dois. “De preferência, não faça dívida. Mas, se tiver que fazê-las, o parceiro tem o direito de opinar, porque, naturalmente, quando há uma dívida é necessário o ajuste dos gastos e do comportamento do casal. E, quando uma pessoa age sozinha, está pedindo para uma bomba estourar lá na frente”, diz Renato.
Inclusive, uma pesquisa realizada por uma fintech de saúde financeira e previdência privada revelou que um em cada quatro homens faz compras escondido da esposa, enquanto uma em cada cinco mulheres tem a mesma atitude. Em relação à periodicidade, 11% dos entrevistados afirmaram que as aquisições acontecem uma vez por mês.
Na prática, os gastos não precisam ser informados antecipadamente, mas precisa existir um acordo entre o casal de que compras acima de determinado valor ou parceladas sejam avaliadas em conjunto.
Conta secreta e gastos com terceiros
Fazer uma poupança é recomendado por todos os especialistas em finanças, mas fazê-la em uma conta à parte, sem a ciência do parceiro, é considerada uma espécie de infidelidade financeira e pode trazer uma série de dúvidas aos casais. “Quarenta por cento dos casais cometem traição financeira porque hoje vivemos uma crise de desconfiança. Se a expectativa é de que o casamento não seja para sempre, logo eu tenho que me precaver para quando ele acabar. Então, por esperar que o casamento acabe, as pessoas estão fazendo o seu pé-de-meia para depois do casamento ”, diz Renato.
Outra situação envolve aqueles que não têm limites quando o assunto é ajudar um amigo ou um familiar. E, por prever uma reação negativa do cônjuge e para evitar brigas, a ajuda é feita com discrição, ou seja, escondido. “Isso vai gerar outro problema e, por isso, tem que existir entendimento entre o casal”, aconselha Renato. O diálogo é importante para definir a condição em que será oferecido suporte em caso de dificuldade de alguém da família. “É importante lembrar que a pessoa tem que ter equilíbrio e não se deixar levar pelo emocional. Às vezes, o grande problema é que ela quer ajudar além dos seus meios e de suas condições porque leva a questão para o lado emocional”, alerta.
Saindo da estatística
Todos os exemplos citados anteriormente reforçam que a infidelidade financeira começa quando um dos cônjuges decide não ser verdadeiro com o outro, independentemente do motivo que o leva a fazer isso. O que pode pôr um fim a esse problema cada vez mais vivido pelos casais é justamente a sinceridade. “Transparência é a base da confiança, enquanto houver segredos não há confiança. Então, por pior que seja a realidade da sua vida, do que você fez, se vocês querem reconstruir a confiança, sejam transparentes”, orienta Renato.
Além disso, é importante ter consciência dos seus atos, ouvir a opinião do cônjuge e reconhecer quando houver um problema, como o gasto exagerado, a necessidade de ostentar, o acúmulo de dívidas, etc. “Vocês precisam entrar em um acordo no que vai mudar, sobre como vão ter acesso às informações financeiras um do outro, como vão falar dos gastos e fazer um orçamento juntos para que haja um alinhamento em relação aos objetivos financeiros”, conclui Renato.
Falar sobre dinheiro e lidar com ele não são tarefas fáceis, mas são ações essenciais para que o casal possa construir uma vida juntos e prosperar. Dessa forma, desenvolverão não só a vida financeira, mas também a amorosa, porque estreitarão a confiança e o respeito de um para com o outro.