Meu herói venezuelano
O repórter Fábio Menegatti, do jornalismo da Record TV, faz uma cobertura especial no país
Quase pisei na caixinha que estava caída na calçada em frente ao hotel. Dentro dela havia um carrinho desses incrementados que criança gosta. Olhei para os lados, nenhum sinal, perguntei na recepção, ninguém sabia. Alguém perdeu.
Guardei o mimo na mochila e saímos de Boa Vista para Pacaraima, 200 km de estrada.
A cidade ao Norte do estado é a porta de entrada dos migrantes venezuelanos que chegam ao Brasil, ainda são por volta de 500 todos os dias, mas já vieram aos milhares. Lá, falta emprego, falta comida, falta perspectiva, falta respeito, falta dignidade. Aqui, há esperança.
Restavam poucos quilômetros para a chegada. A estrada em obras cortava a mata sob o tempo chuvoso desta época da Região Amazônica. Eles estavam ali, no que deveria ser um acostamento e ao lado de uma pilha de canos de concreto para algum fim da engenharia. Três mulheres, duas crianças. Lismania com seis meses, Moisés com sete anos. Queriam chegar a Boa Vista.
Eram duas semanas na estrada, vinham como dava. Às vezes, à pé, de carona, de ônibus. Havia fome, havia medo e os canos de concreto eram abrigos para os menores, pois a chuva que se fazia sentir.
Histórias, entrevistas, gravações. E lá se vai mais uma parte da reportagem que nasce a cada instante.
Na minha mochila, um detalhe. O achado até então sem dono estava por lá ainda na pequena caixa. Ao ver o “regalito”, Moisés abriu aquele sorriso que todo pai ama. E o brinquedo de alguém que não encontrei ganhou razão de ser.
Moisés rodou com o carrinho e, ao ouvir que parecia coisa de super-herói, passou a voar também. Assim como as mulheres que o traziam para o Brasil, sonhou. E sonho de criança acordada é lindo de se ver. Não há céu que o segure. Ali, virou herói.
No adeus, ele já era meu Batman. E assim ele se foi. Entendi, então, que aquele carrinho estava à procura dele. Fico feliz por ter entregue.
Seja feliz por aqui.