Mulheres trans podem disputar competições femininas?
Atleta americana busca, na Justiça, o impedimento dessa prática
A corredora americana Chelsea Mitchell, junto a outras três corredoras, está processando a Conferência Atlética Interescolar de Connecticut (CIAC). O objetivo é impedir que mulheres transgênero disputem competições femininas.
De acordo com a petição, a diferença física entre mulheres trans (que nasceram sob o gênero masculino e fizeram a alteração de gênero posteriormente) e mulheres não-trans é enorme, o que prejudica as disputas, tornando-as injustas.
“Isso porque os machos têm enormes vantagens físicas. Seus corpos são simplesmente maiores e mais fortes, em média, do que os corpos femininos. É óbvio para todas as garotas na pista”, afirmou Mitchell em artigo publicado no USA Today.
A jovem competidora relata que a CIAC passou a aceitar atletas transgênero nas competições femininas em 2017. Nas três temporadas seguintes (17, 18 e 19), as duas competidoras trans registradas levaram 15 títulos em campeonatos estaduais. Essas premiações foram divididas por nove meninas diferentes nas edições anteriores. Para Mitchell, essa disparidade demonstra o quanto o corpo das transgênero é mais forte do que as nascidas mulheres.
Além desses títulos, outras 85 competições de alto nível da CIAC foram vencidas por essas duas novas competidoras.
A própria Chelsea Mitchell (foto abaixo) era considerada a mais rápida do estado na modalidade 55 metros rasos, mas perdeu o posto para uma das atletas trans. Ela também foi vice, perdendo para uma trans, em quatros campeonatos de nível estadual, além de perder inúmeros lugares no pódio.
De acordo com Mitchell, as meninas estão perdendo até mesmo a oportunidade de disputar competições renomadas, uma vez que as seletivas são sempre vencidas pelas atletas trans.
“Meninas e mulheres não devem ser privadas de seu direito à competição justa”, afirma ela. “Não ignore o óbvio: atletas transgêneros merecem compaixão, mas não o direito de transformar os esportes femininos. Isto é errado. E diminui a confiança das mulheres e nossa crença em nossas próprias habilidades”.
É o que aconteceu com Selina Soule (foto ao lado). Ela era considerada uma das favoritas a ganhar o campeonato estadual nos 55 metros rasos. Entretanto, ficou uma posição abaixo da classificação na competição seletiva para o estadual. Na ocasião, as duas primeiras posições foram ocupadas por transgêneros.
Soule perdeu a oportunidade de competir e, consequentemente, ganhar, o torneio mais importante de seu estado. Em consequência, também perdeu a oportunidade de olheiros das universidades a escolherem. Ela destaca como isso se sentiu ao passar por isso:
“É muito frustrante e comovente quando nós, meninas, estamos no início da corrida e já sabemos que esses atletas vão sair e vencer, não importa o quanto você tente.”
A atleta sabe, porém, entende que iniciar essa luta pode fazer com que ela seja malvista na sociedade. Ao levantar sua voz, foi classificada como “má-perdedora”. Ela relata:
“Todo mundo está com medo de retaliações por parte da mídia, das crianças que frequentam o ambiente escolar, de outros atletas, treinadores, escolas, administradores. As pessoas não querem chamar a atenção para si mesmos, e não querem ser vistos como alvos para potenciais intimidações e ameaças”.
Muito além da medalha
O que as quatro atletas pleiteiam judicialmente vai além de medalhas e pódios; e sua luta é movida por mais do que a vaidade de quem perdeu. Na verdade, Chelsea Mitchell já disputa a categoria universitária das competições de atletismo. Se a causa for ganha, o impacto maior será entre as competidoras que têm entre 14 e 18 anos de idade.
Nos Estados Unidos, os esportes são fundamentais na educação da população. Crianças se dedicam desde pequenas para serem escolhidas por boas escolas de Ensino Médio e, posteriormente, por boas faculdades e universidades.
Como as melhores escolas, faculdades e universidades do país são pagas – e muito caras – as bolsas de estudo fazem a diferença na vida de milhares de jovens. Bons atletas, em todos os esportes, são escolhidos por olheiros e ganham bolsas de estudo.
Esses atletas representam suas instituições em competições locais e nacionais. Em troca, podem estudar em instituições de ensino exemplares. Ao final do curso (por volta dos 22 ou 23 anos de idade), o atleta pode seguir profissionalmente.
Entretanto, o mundo esportivo é extremamente seletivo. Mais de 80% dos atletas universitários não se tornam profissionais. A vantagem é que eles têm um curso de Ensino Superior, para iniciar a vida profissional.
Praticamente todos os atletas americanos têm formação superior. O maior jogador de basquete da História, Michael Jordan, é formado em Geografia. O maior jogador de futebol americano, Tom Brady, é formado em Estudos Organizacionais. Venus Williams, uma das maiores tenistas, se formou em Design de Roupas.
Quando as atletas femininas adolescentes perdem espaço para atletas trans, elas também perdem a oportunidade de receberem bolsas de estudo. E, se não seguirem no esporte profissional, tampouco terão estudado nas grandes universidades.
“Além do custo psicológico de sofrer perdas injustas repetidamente, a política do CIAC tem danos mais tangíveis para as mulheres. Isso priva as meninas da chance de correr na frente de olheiros universitários que aparecem para as competições de elite e de competir por bolsas de estudo e oportunidades que vêm com o recrutamento para a faculdade”, explica Mitchell. “Nunca saberei como meu próprio recrutamento na faculdade foi afetado pela perda desses títulos de campeonatos estaduais. Quando as faculdades analisaram meu histórico, não viram a garota mais rápida de Connecticut. Eles viram um segundo ou terceiro corredor”.
Outra atleta coautora do processo é Alanna Smith (foto ao lado). Em suas primeiras competições em sua categoria, ela foi alçada como uma das mais promissoras. Logo no início ganhou um campeonato estadual nos 400 metros rasos, quando não havia atletas trans competindo.
Ao disputar os 200 metros rasos, porém, onde era favorita à vitória, dois atletas que nasceram sob o gênero masculino ocuparam as primeiras posições do pódio, derrubando Smith para a terceira posição.
“Eu espero que as pessoas entendam que muitas pessoas biologicamente mulheres perderam oportunidades de participarem de competições realmente importantes… E os atletas transgênero ocuparam lugares no pódio que pertencem às mulheres biológicas”, confessou Smith à Fox News local.
A disputa judicial foi perdida em primeira instância, mas houve recurso, que deve ser julgado nos próximos meses.
“Ainda não estou derrotado. E nem minhas colegas atletas. E estamos lutando não apenas por nós mesmos, mas por todas as atletas femininas.”
Nos Estados Unidos, adolescentes já podem realizar mudança de gênero. Clique aqui e saiba mais sobre o assunto.