O que pode acontecer com o fim da jornada de trabalho 6X1?
“Um dos maiores erros que existem é julgar os programas e as políticas públicas pelas intenções e não pelos resultados.” A frase é do economista norte-americano Milton Friedman (1912–2006), prêmio Nobel de Ciências Econômicas de 1976, e precisa ser lembrada todas as vezes que políticos populistas propõem soluções simplórias para questões complexas. É o caso da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da deputada Erika Hilton (PSOL-SP), que pede o fim da escala 6×1 (um dia de folga para cada seis trabalhados) e estabelece uma nova jornada semanal: de 36 horas, em vez das 44 horas atuais, em escala 4×3 (três dias de folga a cada quatro trabalhados).
Esse é o tipo de ideia que cai rapidamente nas graças da população e promove debates acalorados nas redes sociais, mas quase sempre sem profundidade e sem embasamento. Aliás, a própria PEC não traz quaisquer dados ou estudos que confirmem a afirmação – presente no texto – de que mais dias de folga aumentariam o consumo, o que compensaria a diminuição da jornada de trabalho.
Para que a equação “aumento do consumo (menos dias de trabalho x mais dias de folga)” se tornasse real, a causa da diminuição do consumo teria de ser a falta de tempo. Porém, segundo um levantamento da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), divulgado em outubro, o principal fator que causou o quarto recuo consecutivo da Intenção de Consumo das Famílias (ICF) foi o medo do desemprego. “O grande fator que o puxou para baixo foi a diminuição da perspectiva sobre o emprego. As famílias estão muito cautelosas com a perspectiva futura do emprego”, disse Felipe Tavares, economista-chefe da CNC, à Agência Brasil.
Em um primeiro momento, a PEC parece realizar magicamente o sonho de muitos: trabalhar menos e manter o mesmo salário. Porém, o resultado real pode ser muito diferente disso. Ao comparar o sucesso da escala 4×3 em outros países, o texto ignora tanto a realidade das empresas no Brasil quanto a baixa produtividade do trabalhador brasileiro. Segundo o Sebrae, 99% dos estabelecimentos no Brasil são micro e pequenas empresas (MPE), que respondem por 52% dos empregos com carteira assinada no setor privado, e um levantamento da Fecomercio/SP mostra que o brasileiro leva uma hora para produzir o que um norte-americano faz em 15 minutos. Isso significa dizer que, se a PEC for aprovada, 99% das empresas brasileiras verão sua produção encolher, mas terão de pagar o mesmo salário a seus funcionários. A proposta do PSOL, porém, não mostra qual é a mágica que o empreendedor brasileiro terá de fazer para que essa conta feche.
O que temos visto ao longo da história é que políticas populistas geram apenas um encantamento artificial, como é o caso do 13º salário, instituído em 1962. Naquela época, o trabalhador comemorou a grande conquista de ganhar um salário a mais por ano, apenas com a canetada de um político bonzinho, mas, na prática, para reequilibrar o caixa, as empresas começaram a diminuir os salários dos novos empregados e a demitir os antigos.
Hoje, o cálculo de salários leva em conta tudo que a CLT obriga as empresas a pagarem: 13º, férias remuneradas, FGTS e tudo mais e faz com que o próprio trabalhador custeie os “benefícios” que a lei exige, ao receber um salário-base mais baixo do que poderia. Sem contar que é o próprio Estado que fica com boa parte do que as empresas gastam com a folha de pagamento, assim como abocanha boa parte do salário do trabalhador a quem jura defender.
Aparentemente, o que interessa para quem propõe e apoia esse tipo de coisa é o ganho político que ela proporciona, elevando o idealizador ao posto de defensor do povo. Ou essas pessoas ignoram a onda de desemprego e desajustes econômicos que a medida pode causar, ou sabem o que vem pela frente, mas estão pouco se importando. E, para prejuízo de todos, as duas alternativas são ruins.
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