Padrões estéticos e o alto preço para alcançar a perfeição

Além de danos psicológicos, a corrida para satisfazer as pressões sociais relacionadas à aparência tem levado inúmeras pessoas à morte

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A busca por cirurgias plásticas segue crescendo no Brasil e no mundo. Só para se ter uma ideia, o número de procedimentos cirúrgicos aumentou 41,3% nos últimos quatro anos, segundo uma pesquisa desenvolvida em 2022 pela Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica e Estética (Isaps). Entre as modalidades mais procuradas estão a lipoaspiração, o aumento de mamas, a cirurgia de pálpebras, a abdominoplastia e o lifting de mamas.

Mesmo com esses dados, o que costuma passar despercebido é o que está por trás desse crescimento. Será que o aumento no número de cirurgias e a popularização das redes sociais, que estimulam a exposição constante na internet, são apenas coincidência? Certamente, não. Todos os dias, as plataformas convidam seus usuários a compartilharem com o mundo um recorte de suas vidas e, em contrapartida, eles também podem acompanhar a vida de outras pessoas. E aí surgem as comparações.

A grande questão é que as comparações nem sempre são justas, afinal, muitas vezes do outro lado encontramos pessoas que modificam as fotos ou até usam filtros para esconder supostas imperfeições de seus seguidores. Mas, na prática, uma vez que aquela imagem “perfeita” entra na mente, ela é lida pelo cérebro como verdadeira e ali começa o processo interno de comparar e analisar o que falta para chegar àquele patamar. “Tudo isso vai levando as pessoas a se sentirem inadequadas. Isso acaba gerando ansiedade e uma busca que muitas vezes foge da realidade da pessoa, ou seja, do que ela vive no dia a dia. Além disso, sem conseguir se encaixar no padrão do outro, a pessoa acaba sentindo um vazio, uma angústia, que pode levar a uma crise de identidade”, explica a psicóloga clínica Erika Mieko Yoshioka.

Essa cobrança estética e a busca pelos traços perfeitos são mais comuns entre as mulheres e podem levar a uma série de problemas que vão desde sentimento de inferioridade e baixa autoestima até transtornos mentais e alimentares, como anorexia e bulimia. No caso das cirurgias, o maior risco é a morte.

MEDO DA REALIDADE?
Atualmente, o Brasil ocupa o segundo lugar no ranking de procedimentos estéticos, atrás apenas dos Estados Unidos, e o que tem chamado a atenção é o aumento de pacientes com menos de 30 anos. Esse cenário pode estar diretamente ligado à associação da beleza física ao sucesso, por exemplo.

Uma pesquisa global feita por uma empresa farmacêutica irlandesa entrevistou em 2019 cerca de 14,5 mil pessoas nascidas entre as décadas de 1980 e 1990 em todo o mundo e mais da metade estaria disposta a passar por procedimentos cirúrgicos.

Considerando todos os entrevistados, 61% deles concordaram com a afirmação de que a aparência contribui para o sucesso em todas as áreas da vida. Quando selecionados apenas os brasileiros, o índice sobe para 81%, ou seja, a população brasileira valoriza muito mais a beleza do que os habitantes de outros países.

É preciso reforçar que o autocuidado é muito importante para todos, mas os exageros tendem a ser prejudiciais tanto a curto como a longo prazo. “Um dos sinais de que há uma preocupação exagerada com a aparência é quando se gasta muito mais tempo investindo na beleza do que em outras atividades produtivas, o que significa que a pessoa está deixando de viver”, diz Erika.

Ainda segundo a pesquisa, 43% dos brasileiros ouvidos na faixa dos 30 anos desejavam suavizar as rugas e linhas de expressão, o que nos leva a outro aspecto presente na sociedade atual: o medo do envelhecimento.

Para fugir dos sinais naturais da passagem do tempo, os que valorizam em excesso a aparência se viciam nos procedimentos estéticos e até ultrapassam a linha do exagero. A pergunta é: por que aceitar as linhas de expressão ou os cabelos brancos se tornou tão difícil?

É possível que esse medo esteja ligado à construção social que o envelhecimento significa levar uma vida inativa, marcada pela solidão e pela dependência. Essa imagem, no entanto, precisa ser reconstruída e levar em consideração que a expectativa de vida do ser humano atualmente é bem maior, em torno de 75 anos no País, e esse período pode ser vivido com qualidade.

Na verdade, é preciso encarar a longevidade como um privilégio, já que há cem anos a expectativa de vida do brasileiro era de 35 anos. Dá para acreditar?

Máquina de fazer dinheiro
Não espere que o mundo se una para quebrar padrões ou para estimular seu amor-próprio, pois isso tem que partir de cada um de nós. Vale ainda lembrar que fazer as pessoas acreditarem que não são boas ou bonitas o suficiente se transformou em uma máquina de fazer dinheiro. De forma cruel essa ideia é implementada sutilmente por meio de propagandas, matérias e mais recentemente pelos influenciadores, que sugerem os supostos defeitos e indicam a solução.

Segundo um levantamento da empresa Euromonitor International, o Brasil é o quarto maior mercado de beleza e cuidados pessoais no mundo, perdendo só para os Estados Unidos, a China e o Japão, o que torna o setor extremamente rentável.

Por isso, para ser mais um refém da indústria da beleza, é preciso exercitar o pensamento crítico. “É importante entender que cada um é um ser único, que tem algo especial com as suas próprias características e que ninguém precisa ficar copiando padrões. Antes de fazer uma cirurgia é importante se questionar, por exemplo, o motivo dessa escolha. Avaliar se é por impulso, modismo e se perguntar as possíveis consequências do procedimento no futuro. Quanto mais uma pessoa se questiona, mais ela vai se conhecer”, diz Erika.

Além do que já foi destacado anteriormente, vale ressaltar que o ser humano é muito mais do que a aparência. Somos também formados pelo caráter, pela disposição, pela inteligência, pelas ações, pela forma de tratar o próximo e, principalmente, por termos a essência de Deus. Se isso não estiver presente dentro da pessoa, nenhuma beleza do mundo será suficiente para lhe trazer realização. Fomos projetados pelo Criador e a Presença dEle nos dá o brilho no olhar, o sorriso sincero e a confiança de ter uma identidade própria, seja lá quais forem a opinião alheia ou os padrões. Esse deve ser o maior investimento de cada pessoa.

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Colaborador

Cinthia Cardoso / Fotos: Christopher Ames/getty images / Wavebreak Media LTD/getty images