Precisamos falar sobre bullying
Um em cada quatro estudantes brasileiros é vítima dessa prática. Identificar os sinais precocemente e oferecer orientação ajudam a combater o problema
O bullying é uma prática que sempre existiu, principalmente na infância e na adolescência. Mas, nos últimos anos, vem ganhando cada vez mais atenção por causa das diversas consequências físicas, psicológicas e comportamentais geradas tanto nas vítimas quanto nos agressores.
Trata-se de uma prática tão séria que, atualmente, é considerada um problema crônico nas escolas do Brasil. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a quantidade de menores que são vítimas do ato cresceu de 35%, em 2012, para 47%, em 2016. Para se ter uma ideia: um em cada quatro estudantes é alvo desse tipo de violência.
Diante da gravidade do problema e da necessidade de medidas para controlá-lo, em 14 de maio entrou em vigor a Lei 13.663/2018, que atribui às escolas a responsabilidade de combater o bullying dentro de seus espaços físicos.
Essa norma acrescenta dois pontos ao artigo 12 da Lei de Diretrizes de Bases e Educação (LDB), que incumbe aos estabelecimentos de ensino “promover medidas de conscientização, prevenção e combate a todos os tipos de violência” e “estabelecer ações destinadas a promover a cultura de paz”.
A ideia é incentivar os estabelecimentos a criarem projetos que contribuem com a identificação precoce do bullying e, em conjunto com os pais, fazerem as devidas intervenções antes de haver consequências mais drásticas, como suicídios.
Em agosto de 2016, por exemplo, um estudante de 13 anos, integrante de uma escola de Nova York, nos Estados Unidos, se matou depois de ter reclamado várias vezes com pais e professores que estava cansado de receber agressões.
Em 2017, Mallory Grossman, de 12 anos (foto a esq.), também cometeu suicídio em razão do bullying que sofria dos colegas na escola que estudava no Estado norte-americano de New Jersey. Este ano, os pais dela, Dianne e Seth, entraram com ação contra o estabelecimento, alegando que a instituição ignorou as queixas da menina e não tomou atitudes para evitar o problema.
Aqui no Brasil, a Justiça também está mais assertiva para punir os estabelecimentos que não coíbem essa prática. Recentemente, o governo do Estado de São Paulo foi condenado a indenizar em R$ 8 mil uma aluna deficiente mental que sofria bullying dentro de uma escola estadual em Santos, no litoral paulista. Segundo os desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo que julgaram o caso, a instituição não havia adotado medidas para proteger e resguardar a integridade física, moral e psicológica da estudante.
Todos sofrem
O bullying é caracterizado por atitudes agressivas e repetitivas que promovem desigualdade e exclusão social, causando danos físicos e/ou emocionais com efeitos diretos sobre a vítima.
Geralmente, quem pratica o bullying está em busca de popularidade para encobrir a sua insegurança e obter uma boa imagem de si mesmo. Então, quando há pessoas ao redor, o agressor tende a reforçar suas atitudes para constranger seus alvos.
Por causa disso, durante essa prática sempre haverá plateia, conforme explica o pediatra Abelardo Bastos Pinto Junior (foto a dir.), do Departamento Científico de Saúde Escolar, da Sociedade Brasileira de Pediatria. “Para ser caracterizado bullying, é necessário haver audiência, ou seja, testemunha, que pode incentivar o ato, achando-o interessante; pode se opor, defendendo a vítima; ou ainda não se envolver, ficando quieta, por exemplo.”
A psicóloga e terapeuta cognitiva Carolina Lisboa acrescenta que se trata de um fenômeno grupal. “Pode haver um ou mais agressores. Há seguidores desses agressores e há jovens que não se envolvem, mas que sofrem também”, completa.
Muitas vezes, as vítimas e os agressores não contam aos pais e aos professores que estão sofrendo por terem medo ou vergonha das consequências. “Não se trata de esconder, mas de não conseguir falar. Vítimas sofrem ameaças graves e, muitas vezes, também há a negligência da escola. E os agressores não querem relatar porque têm consciência do que fazem e só o fazem por temer virar vítimas. Enfim, todos precisam de ajuda”, defende a psicóloga.
Em razão disso, é preciso que os pais fiquem atentos aos sinais que podem indicar que seus filhos estão sofrendo bullying, como ataques de fúria, impulsividade, sentimento de incapacidade, agitação, aparecimento de ferimentos ou hematomas e de roupas rasgadas, sumiço de pertences, entre outros. “Quem é vítima fica menos autoconfiante e não quer mais ir à escola. As notas e a concentração podem cair. Ainda é possível notar isolamento, irritabilidade, mudanças bruscas de humor, choros imotivados, retraimento social e dificuldades de sono e de se alimentar”, enumera Carolina.
O pediatra Abelardo acrescenta que é possível ocorrer também sintomas físicos. “A criança começa a ter dores abdominais e de cabeça, além de mal-estar antes de ir para a escola”, adiciona.
Força interior
A estudante Estefanne Soares Farias, de 14 anos (foto a dir.), sempre dizia que não queria ir mais à escola em função do bullying que sofria. Os colegas zombavam dela e lhe davam apelidos pelo fato dela ter uma má-formação nos lábios e no queixo. “Eu me sentia muito constrangida, humilhada, triste e incapaz de ser aceita pela sociedade. As palavras que diziam me doíam mais que um tapa”, descreve.
A menina passou a ficar mais retraída e deprimida. “Comecei a ser mais tímida e a não me relacionar com as pessoas porque tinha medo delas me ‘zoarem’ também. Me sentia muito sozinha.”
A mãe, Iraneide Soares (foto abaixo), sempre tentava encorajá-la, mas Estefanne vivia com medo de ser sempre alvo de chacotas. “Eu falava para que ela reagisse, sempre lhe dava apoio, mas, quando ela se escondia atrás de mim, eu já sabia o motivo de sua vergonha”, conta a mãe.
Foi nos encontros do Força Teen Universal (FTU) que a adolescente recebeu a força de que precisava para se sentir capaz de enfrentar esse problema. “O grupo me mostrou que eu não era aquilo que as pessoas falavam, que não importava o que os outros pensassem de mim, mas o que Deus pensava, e que minha aparência não impedia que Ele me ouvisse e me capacitasse”, alega a adolescente.
O FTU (antigo TF Teen) é um grupo da Universal que direciona seus trabalhos exclusivamente aos adolescentes, ensinando-os a lidarem com os problemas, como abusos, violência e mau comportamento, tornando-os fortes para poderem ingressar na vida adulta seguros e confiantes. Durante os encontros, eles compartilham experiências e praticam atividades que fortalecem a autoestima e refinam o caráter.
A mãe de Estefanne reforça que a participação neste grupo deixou sua filha mais corajosa e com a autoestima elevada. “Aos poucos, ela foi se sentindo capaz de enfrentar os problemas, entendendo que outras pessoas também passam por dificuldades e são felizes.”
Aprendizado
É na infância que obtemos grande parte do nosso aprendizado. As percepções sobre o mundo em que vivemos e o modo como vemos as pessoas são traçados durante esse período. Portanto, uma experiência traumática nessa idade pode deixar sequelas na fase adulta.
Crianças e adolescentes que sofrem bullying podem ter instabilidade nas relações sociais, depressão, propensão ao vício e três vezes mais chance de pensar em suicídio. “A falta de confiança pode ocorrer na vida adulta. A ansiedade também tende a aumentar e culminar em quadros de fobia social. Mas nada pode ser visto como verdade absoluta. Vários jovens são resilientes a essa violência e se desenvolvem saudavelmente”, aponta a psicóloga Carolina (foto a esq.).
A Escola Bíblica Infantil (EBI), na Universal, ensina às crianças a serem fortes emocionalmente em situações adversas. Para combater o bullying, a coordenadora da EBI, Jane Garcia, relata que as educadoras ensinam aos pequenos que todos são iguais. “Um dos ensinamentos que damos é que Deus nos fez à Sua imagem e semelhança, conforme está em Gênesis. Ele também criou a natureza com muitos detalhes, que existem diferenças entre os bichos, entre as flores, as plantas, etc. Por isso, nós também somos diferentes e não existe bonito ou feio, porque cada pessoa é única e amada pelo Criador”, exemplifica.
Ela ressalta que o acompanhamento muitas vezes é feito individualmente. “Em todas as aulas, reservamos alguns minutos para ouvirmos cada criança e tratarmos de suas dificuldades. Então, quando relatam algo sobre bullying, cuidamos da criança até que fique confiante e supere.”
Nas aulas, um dos exemplos usados é o do Bispo Edir Macedo, que também sofreu bullying quando era criança. “Usamos um trecho do filme Nada a Perder e as crianças se identificaram. A cena em que a mãe dele o incentiva a ser forte é um conselho e tanto aos pais, pois palavras positivas tem um alto poder de transformação para quem as escuta”, aponta Jane.
Lauryn Kamilla Menezes da Silva, de 16 anos (foto a esq.), colocou em prática o que aprendeu na EBI quando criança para saber lidar com o bullying que passou a sofrer de seus colegas por causa de sua baixa estatura e do seu cabelo crespo. “Não me aceitavam nos grupos, me ignoravam por ser a menor da classe e principalmente pelo meu cabelo. Me apelidavam com nomes horríveis, maldosos e chegaram a esconder meus pertences só para me provocar.”
A mãe, Marta da Silva Lima (foto a dir.), conta que a menina quase chegou a ser violentada. “Uma vez, ela me disse que uma criança queria agredi-la porque não ‘ia com a cara dela’. Isso a deixava triste e insatisfeita”, acrescenta.
Por causa do bullying, Lauryn tentava fazer várias mudanças no seu comportamento para ser aceita pelos colegas. “Cheguei a me vestir de preto diariamente, tentando ser gótica. Tinha noites que só chorava pensando em sumir da escola”, comenta.
Aos poucos, ela foi aprendendo a se valorizar. “Recebi a orientação sobre como vencer o bullying. Comecei a me amar e parei de me importar com o que diziam. Logo, todas as brincadeiras de mau gosto que pareciam eternas finalmente acabaram”, ressalta.
A mãe de Lauryn destaca que a fé foi primordial para que a adolescente superasse o problema. “A fé trouxe-lhe a convicção de que ela não precisa ter um corpo perfeito nem os cabelos lisinhos para ser linda diante de Deus”, complementa.
Família presente
Para prevenir o bullying, a Sociedade Brasileira de Pediatria orienta que os pais estejam sempre presentes no dia a dia dos filhos. “Mantenha o computador da criança na sala, pesquise o nome dela em sites, saiba em quais grupos ela está inserida, que atividades ela realiza, quem são seus amigos, etc.”, adverte o pediatra Abelardo.
Se houver bullying, a família não deve atribuir a culpa ao filho, tampouco minimizar o problema. É preciso que os pais busquem respostas para os motivos do comportamento, buscando soluções positivas com ele, tanto no caso de a criança ser vítima como agressora. “É preciso evitar críticas e violência, oferecendo-lhe confiança para dialogar, dando-lhe abertura para se expressar”, afirma Abelardo.
Iara dos Santos Ferreira sempre incentivou seu filho Isaías Ferreira de Lima, de 12 anos (foto a dir.), a contar seus problemas. Então, quando ele passou a sofrer bullying na escola, encontrou na mãe a orientação para saber combatê-lo. “Cochichavam sobre mim e me chamavam de feio. No começo foi difícil, mas eu sempre tive minha mãe ao meu lado e, quando eu contava para ela o que acontecia, ela me fortalecia.”
“Desde pequeno, eu lhe dava palavras de fé que faziam com que ele mudasse seus pensamentos e elevasse sua autoestima”, revela Iara.
Por causa disso, Isaías deixou de se importar com seu problema físico. “Me lembro que quando pequeno, na EBI, perguntaram a uma educadora sobre minha orelha e ela cantou uma música dizendo que eu era especial. Então, comecei a ignorar os comentários, pois já entendia que todos são iguais.”
Em vez de se preocupar com o bullying que sofria, Isaías procurava fazer o que mais gostava: jogar futebol. “A fé o ajudou a ignorar os comentários maldosos e ir em busca de seus objetivos, mesmo ainda sendo criança. Hoje ele é lateral direito no time Sub-13 do Palmeiras e é um adolescente dedicado, obediente, que tem os pés no chão e que sabe que tudo é conforme a vontade de Deus”, completa Iara.
Como descrito acima, os casos de bullying, infelizmente, são bastante comuns, mas, com a participação de pais e educadores, é possível enfrentar e combater o problema. Se você tem um filho nesta situação e não sabe como enfrentá-la, não hesite em procurar ajuda nos grupos citados nesta matéria. Para saber mais informações, procure uma Universal mais próxima aqui.