Proibição da Bíblia em bibliotecas e escolas reforça perseguição milenar
Recentemente, uma decisão polêmica chamou a atenção de especialistas. O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional uma lei aprovada em Mato Grosso do Sul que determinava que as escolas públicas e as bibliotecas do Estado tivessem, ao menos, um exemplar da Bíblia.
“A decisão é equivocada. Se existe uma liberdade religiosa e o Estado é laico, uma coisa não se confunde com a outra”, afirmou o advogado Alfredo Scaff Filho ao portal R7. De acordo com ele, “isso é um absurdo!”
Para o filósofo Pedro Henrique Alves, essa decisão não faz sentido em nenhuma instância. O especialista lembra a presença de obras questionáveis nesses locais, como o livro didático Araribá mais Geografia, direcionado a alunos do sétimo ano do ensino fundamental, que explica as origens do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MST). “Como pode a democracia ser vilipendiada por um livro que fundamenta historicamente a civilização ocidental e dá os insumos filosóficos básicos que alicerçam a ética moderna, conjunto esse que possibilitou a democracia moderna? Como pode ser mais importante a biblioteca de uma escola ter O Manual do Guerrilheiro, livros do MST, como Araribá mais Geografia, ou Crepúsculo do que a literatura que gestou a narrativa mais refletida e adotada na história da escrita humana?”, questiona o filósofo.
Esse questionamento é facilmente respondido quando entendemos que essa é uma perseguição antiga e analisamos a trajetória da Bíblia ao longo dos anos. Desde sua criação, diversos líderes – políticos e religiosos – fizeram de tudo para destruí-la. Na Idade Média, pessoas que tinham uma Bíblia eram tachadas de traidoras e sofriam duras condenações. Entre todos os livros produzidos na Antiguidade desde a criação da escrita, nenhum foi tão perseguido e queimado quanto a Bíblia. Mas, apesar disso, continuou existindo e hoje é considerado o maior best-seller (ou seja, o maior sucesso de vendas) de todos os tempos. Com 3,9 bilhões de cópias já impressas, a Bíblia é a obra mais lida do mundo e, segundo a Sociedade Bíblica do Brasil (SBB), já foi traduzida para, aproximadamente, três mil idiomas.
Não há como negar que as Escrituras não só tenham influenciado as leis e os idiomas de alguns países, como também a vida de milhões de pessoas. “Como falar de ética e moral sem conhecer os conceitos cristãos bíblicos, que fundamentam até hoje as nossas percepções nesses campos? A Bíblia é mais do que um devocional individual, ela é também o arrimo psicológico, histórico e filosófico de nossa civilização, o código que desvenda os meandros de nossa consciência – e, se isso tudo não for suficiente para mantê-la numa biblioteca escolar pública, realmente não sei o que seria”, acrescenta o filósofo Pedro Henrique Alves.
Assim, a permanência da Bíblia nas bibliotecas é mais do que uma questão religiosa, é o fundamento social e humano de nossa cultura. “E esses são os esteios da nossa civilização. Absurdo, na minha opinião, seria não a ter nas estantes de um acervo público. Estão confundindo laicidade com militância. Laicidade não é a exclusão de uma plataforma religiosa em nome de igualdade, é justamente o contrário. Isto é, o ato de o Estado possibilitar o acesso, ou ao menos não atrapalhar, a todas as matrizes religiosas que sejam relevantes ao público e o conhecimento desenvolvido.
Não ter Bíblia nas bibliotecas públicas é um ato de militância e definitivamente não se trata de ‘democracia’ ou ‘princípio da laicidade’”, conclui o especialista.
Ana Carolina Cury é jornalista