Redes sociais ou iscas emocionais?

Investigação mostra Facebook confessando que sua empresa causa ansiedade e ideação suicida em adolescentes

Imagem de capa - Redes sociais ou iscas emocionais?

Um relatório veiculado em matéria do jornal norte-americano The Wall Street Journal sob o título Os arquivos do Facebook revelou detalhes surpreendentes sobre o uso do Instagram. O aplicativo de compartilhamento de fotos estaria diretamente envolvido com o aumento da ansiedade e da ideação suicida em uma porção significativa de adolescentes vulneráveis, de acordo com uma pesquisa controlada estritamente pelo próprio Facebook, que detém o Instagram e outras plataformas.

A matéria, publicada em setembro, mostrou que nos últimos três anos o Instagram promoveu estudos internos sobre o aplicativo e seus milhões de usuários adolescentes e que os dados são expressivos: uma das apresentações de slide, de março de 2020, apontou que para 32% das adolescentes que se sentem mal com seu corpo “o Instagram as fazem se sentir pior” e que “os adolescentes culpam o Instagram pelo aumento da taxa de ansiedade e depressão.” Outra informação relevante: 13% dos usuários britânicos e 6% dos norte-americanos manifestaram desejo de se matar.

No entanto, em vez de reconhecer os dados como um problema de saúde pública, o Facebook estaria focado em aumentar sua base de consumidores jovens e perpetuar (inclusive financeiramente) sua trajetória: vale ressaltar que a receita anual da empresa ultrapassa US$ 100 bilhões e que mais de 40% dos usuários do Instagram têm 22 anos ou menos. Recentemente, constava nos planos da empresa a criação de um produto no Instagram para crianças menores de 13 anos. Após muitas críticas de especialistas e do público em geral, a empresa desistiu do projeto, mas o próprio Instagram já possui usuários dessa faixa etária.

O QUE ELES SABEM E VOCÊ NÃO?
A reportagem apontou que “os documentos do Instagram fazem parte de um tesouro de comunicações internas em áreas como saúde mental de adolescentes” e que, apesar de conhecer o mal que suas plataformas podem causar, o Facebook “tem feito esforços mínimos para resolver esses problemas.” Ainda fica claro que “a tendência de compartilhar apenas os melhores momentos, uma pressão para aparentar perfeição e um produto viciante pode levar os adolescentes a uma espiral de transtornos alimentares, uma sensação doentia em relação aos seus próprios corpos e à depressão”, afirma a pesquisa.

NO MÍNIMO, CONTRADITÓRIO
Mas não é só o Instagram que prejudica crianças e adolescentes. O The Wall Street Journal também publicou uma reportagem apontando que o TikTok, rede social chinesa de vídeos curtos, exibe até mesmo pornografia e conteúdo com drogas e álcool para crianças com 13 anos ou menos. O aplicativo chegou a justificar “que atualmente não diferencia os vídeos veiculados para contas de adultos e crianças”, mas que uma ferramenta de filtro para contas de quem é mais jovem estaria sendo desenvolvida. Apesar da promessa, até o momento nada concreto foi feito a esse respeito.

Além disso, vez ou outra, o aplicativo desperta dúvidas sobre a segurança dos dados, a liberdade e a gestão de conteúdo: o mesmo TikTok tem censurado e colocado em banimento temporário conteúdos cristãos. Isso é, no mínimo, contraditório: essas plataformas exibem nudez e uso de drogas ilícitas e condenam o cristianismo. Qual tipo de interação ou manipulação social, afinal de contas, elas desejam promover?

CONVERSA, LIMITES OU OS DOIS?
Diante dos dados citados no início do texto e, sobretudo, dos fatos, a pergunta é: qual seria o papel e a responsabilidade dos pais e responsáveis quanto à facilidade de acesso às redes sociais por parte de crianças e adolescentes? Devem existir limites?

Vale lembrar que recentemente uma publicação da médica Fernanda Rocha que viralizou no seu Instagram justificava a ausência da filha nas mídias sociais. A garota de 14 anos tinha um perfil com quase 2 milhões de seguidores no TikTok. “Decidi apagar a conta do TikTok e do Instagram dela. Chata, eu sei, mas nossa função como mãe não é ser amiguinha de vocês”, afirmou Fernanda. “Não acho saudável nem para um adulto e muito menos para uma adolescente basear referências de autoconhecimento em feedback virtual. Isso é ilusão. […]

Dezenas de fã-clubes, tudo muito doce, mas também prejudicial para qualquer adolescente em processo de descoberta e de busca pela individualidade. Eu não quero que ela cresça acreditando que é esse personagem. […] Não quero minha filha brilhante se prestando a dancinhas diárias como um babuíno treinado. Acho divertido… e megainsuficiente”.

Leia, acima, a opinião de Verônica Kehdi, psicóloga clínica e especialista em desenvolvimento de pessoas e grupos terapêuticos.

imagem do author
Colaborador

Flavia Francellino / Foto: getty images