Ultraprocessados à vista
Publicidade massiva, ideia de praticidade e preços atraentes levam a população a comer mal e perder a saúde
O chuchu e abobrinha não fazem nossos olhos brilharem como outros produtos que estão expostos nos supermercados, que sempre estão cheios de novidades e com opções cheias de açúcares, gorduras e aditivos. Mas nem sempre a escolha por esses itens atraentes decorre de preferência. A verdade é que produtos industrializados, muitas vezes, são mais viáveis financeiramente. Um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), publicado em março, mostra que moradores de comunidades brasileiras recorrem aos ultraprocessados porque nessas áreas “o acesso aos alimentos saudáveis é mais desafiador, o que causa impacto em seu consumo”. A realidade é que, seja pelo preço que favorece o acesso, seja pela facilidade de abrir a embalagem, os ultraprocessados entraram na casa de muitas pessoas.
José Marcelo Natividade, endocrinologista, metabologista e pós-graduado em nutrologia, afirma que um dos vilões que impedem a maioria dos brasileiros de ter uma dieta mais saudável é a alta disponibilidade de produtos ruins: “hoje, temos muito mais oferta de ultraprocessados, rápidos e pré-preparados do que de alimentos in natura. A propaganda e a indústria alimentícia investem pesado para que isso aconteça. Dessa forma, chega até nós uma série de publicidades que criam a necessidade e o desejo de consumi-los”. Outra questão é que, quanto mais natural e orgânico e menos processado for o alimento, maior será seu custo. Ele ainda avalia que “a vida hoje é muito corrida, as pessoas mal têm tempo de dizer bom dia e comer tornou-se ‘perda de tempo’. As pessoas querem algo rápido, gostoso e prático e, infelizmente, rápido, gostoso e prático não corresponde aos alimentos mais saudáveis. Essa praticidade seduz para o consumo de alimentos errados”.
OBESIDADE EMBRULHADA
O Ministério da Saúde detalha que, no rol dos industrializados, estão as “guloseimas, bebidas com açúcar ou adoçantes artificiais, pós para refrescos, embutidos e outros produtos derivados de carne e gordura animal, produtos congelados prontos para aquecer, gelatinas artificiais, misturas para bolo, sopas em pó, macarrão instantâneo e uma infinidade de novos produtos que chegam ao mercado todos os anos, incluindo salgadinhos de pacote, cereais matinais, achocolatados, barras de cereal e bebidas energéticas” e afirma que “há uma relação direta entre esses alimentos e as doenças crônicas. O consumo excessivo de açúcar pode estar relacionado ao surgimento do diabetes; o de sal, à hipertensão; e o de calorias ao surgimento da obesidade.” Desembalar mais e descascar menos aumentaria em 26% o risco de obesidade, elevaria o risco de sobrepeso em 23% e o de síndrome metabólica (condição que aumenta o risco de doença cardíaca, acidente vascular cerebral e diabetes) em 79%, indica a instituição.
Natividade considera que “a obesidade é a manjedoura de diversas doenças” e a estimativa é que, em 2025, 2,3 bilhões de pessoas estarão acima do peso e 700 milhões obesos. “No Brasil, o índice de pessoas acima do peso subiu 72% desde 2010”, diz.
UM “PORÉM”
A ingestão de dietas à base de mirtilos colhidos por camponesas nos Alpes Suíços, obviamente, pesaria no bolso. Então, o jeito é fugir de propostas mirabolantes e adotar o básico, que funciona desde que o mundo é mundo. Thais Verdi, nutricionista graduada em bioquímica, fisiologia e nutrição esportiva e pós-graduada em nutrição clínica ortomolecular, declara que “fazer dieta não gasta nada além do habitual, a menos que você compre produtos industrializados do tipo diet, light, fit, se iluda com o bolo, a barrinha de cereal, o chá milagroso para desinchar ou com suplementos desnecessários. Daí não tem jeito: o que você conseguirá reduzir é o saldo da sua conta bancária”. Por isso, o conselho dela é emagrecer revendo comportamentos: “mastigue bem e descanse os talheres sobre o prato depois de cada garfada. Comer devagar facilita a digestão e intensifica o sabor da comida. Faça as refeições sentado à mesa e em ambiente tranquilo, evite comer em frente à TV ou enquanto lê ou conversa. Ingira líquidos ao longo do dia e entre as refeições. Fazer atividade física regularmente também é indicado, pois ela ajuda a queimar calorias, favorece o controle da glicemia e acelera o metabolismo”.
Para que tenhamos boa saúde, Natividade diz que devemos entender que tudo começa com a alimentação: “o que consumimos nos trará melhor saúde ou não. Então, devemos fazer as melhores escolhas possíveis dentro das nossas possibilidades. Além disso, ele recomenda a adoção de práticas mais saudáveis, a redução do sedentarismo e, se possível, a eliminação dos maus hábitos. Isso contribui para que vivamos em harmonia com a balança. A saúde e o nosso peso andam juntos tanto para o bem como para o mal”.
MENOS CUSTO NO BOLSO E MUITO MAIS SAÚDE
Dê preferência a produtos sazonais e locais. Alimentos em época de safra estão com o sabor realçado e são mais baratos. Abril, por exemplo, é época de mamão, uva, maçã, alface, repolho, abóbora, berinjela, abobrinha, tomate e pepino
Pela necessidade de baixa ingestão diária, alguns alimentos considerados caros podem ser ótimas escolhas
Vá ao mercado com uma lista do que é necessário adquirir. A falta de planejamento pode induzir a escolhas desnecessárias
Produtos a granel, por vezes, têm um preço mais em conta do que os que já estão embalados
Congelar alimentos, além de evitar possíveis desperdícios, pode ajudar a fazer economia e a adotar uma alimentação mais saudável