Você conhece a armadilha das apostas on-line?

A ilusão de ganho de dinheiro fácil já fez os brasileiros perderem mais de R$ 23 bilhões em um ano. Agora, milhares estão endividados e viciados em jogos que acessam pelo celular. Alguns abandonam sonhos e até deixam de comer para poder jogar

Imagem de capa - Você conhece a armadilha das apostas on-line?

A promessa de ganhar dinheiro fácil ainda é uma das principais armadilhas que levam muitos brasileiros ao prejuízo. A moda atual são as apostas on-line chamadas ‘bets’, que, disfarçadas de entretenimento, atraem um grande público com a ilusão de retornos elevados e rápidos. Além delas, há os jogos de azar ilegais, caso do Fortune Tiger, conhecido como jogo do tigrinho. Enquanto as empresas de jogos lucram, a população vê o rombo em suas finanças.

Dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) revelam que os jogos de azar on-line deixaram 1,3 milhão de brasileiros inadimplentes apenas no primeiro semestre deste ano. Entre junho de 2023 e junho de 2024 foram gastos cerca de R$ 68,2 bilhões em apostas pela internet, valor que corresponde a 0,62% do Produto Interno Bruto (PIB) do País. No mesmo período, as perdas ficaram em torno de R$ 23,9 bilhões, segundo estudo conduzido pelo banco Itaú.

Esse tipo de aposta ganhou uma força extraordinária nos últimos meses graças a uma estratégia intrigante que envolve influenciadores, facilidade de acesso pelo celular e até mesmo a paixão pelo futebol. Dados da ferramenta de análise de sites SimilarWeb divulgados em 2023 mostram o Brasil como líder absoluto em acessos a plataformas de apostas, com 3,19 bilhões de visitas em 2022.

Só para se ter uma ideia, nos sete primeiros meses deste ano, cerca de 25 milhões de pessoas passaram a fazer apostas on-line, segundo o Instituto Locomotiva. Os apostadores em sua maioria são homens (53%), na faixa de 30 a 49 anos, e pertencem às classes C, D e E (80%). Segundo o Banco Central, no último mês de agosto, 5 milhões de beneficiários do Bolsa Família destinaram parte do valor recebido para empresas de apostas. É ou não é um assunto com o qual devemos nos preocupar?

Prejuízo no bolso e na vida

Quanto às consequências relacionadas às apostas on-line, o estudo do Instituto Locomotiva traz informações alarmantes. Entre os entrevistados adeptos dos jogos, 45% afirmaram que as apostas esportivas já lhes causaram prejuízos financeiros e 37% disseram que usaram dinheiro destinado a outras coisas importantes para apostar. O resultado disso é devastador: 86% das pessoas ouvidas têm dívidas e 64% estão negativadas.

Para os mais jovens, o impacto está ligado à educação: 35% dos brasileiros que planejavam entrar no ensino superior neste ano – cerca de 1,4 milhão de pessoas – adiaram a decisão por ter parte da renda comprometida com os jogos. Esse dado é fruto de uma pesquisa da Educa Insights.

O caminho do vício

Entre 2018 e 2023, o número de atendimentos psicológicos realizados para pessoas com dependência em jogos de azar nos Centros de Atenção Psicossocial (Caps) teve um aumento de 1.094% e passaram de 108 para 1.290 atendimentos, segundo o Ministério da Saúde. “Isso se deve ao fato de os jogos desencadearem reações químicas no cérebro, como a liberação de dopamina, que é um neurotransmissor associado ao prazer e à recompensa. O cérebro e o corpo ainda recebem o impacto da adrenalina (liberada em situações de estresse ou excitação), responsável por deixar a pessoa excitada e eufórica. Isso tudo, associado às estratégias dos jogos para manter a conexão com quem está do outro lado, pode levar ao vício”, explica a psicóloga Lilian Neves.

Ela afirma que, além do vício, essa relação com os jogos pode desencadear perdas muito mais significativas do que financeiras. “Por causa do tempo que a pessoa fica on-line jogando em uma aposta atrás da outra, o vício acaba a afastando do convívio com outras pessoas e também da própria família. Isso traz problemas de relacionamento por conta do uso desenfreado e do gasto financeiro”, declara.

Busque ajuda

Envolvido nesse mundo de ganhos e perdas, o indivíduo nem sempre se dá conta de que o que começou como diversão passou a ser um vício. “Se você sente que quer sempre jogar mais e que não consegue sair daquele ambiente on-line, já é um sinal de alerta”, diz a psicóloga. Mentir para esconder o valor gasto e pensar constantemente nas apostas também são sinais de vício.

Reconhecer a dependência é essencial para que haja uma mudança de rota. “É possível reverter esse quadro buscando ajuda especializada para obter orientações, grupos de apoio e praticando atividades físicas. Ter uma crença e se conectar com o divino também é uma forma de se fortalecer e ajudará nesse processo de recuperação”, detalha Lilian.

Um dos trabalhos que se destacam na prestação de apoio aos dependentes é o Vício Tem Cura, mantido pela Universal. “Sempre ensinamos que o vício não está apenas relacionado à substância ou às apostas, mas a um espírito que atua na mente da pessoa. Temos recebido jovens e senhores que perderam muito em jogos on-line, caça-níquel e conseguiram se reeguer”, afirma o Bispo Nilton Patrício. Para saber mais sobre o projeto e buscar ajuda gratuita, acesse viciotemcura.com.

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Colaborador

Cinthia Cardoso / Arte de Edi Edson sobre fotos GettyImages